sábado, 23 de fevereiro de 2008

Estudantes nas Universidades: Formação de mão de obra barata e subserviente

Comunicado da Ação Direta Estudantil – Ano III – Nº 4 Janeiro 2006
O atual modelo de acumulação do capital, baseado na liberalização financeira, comercial e produtiva necessita não só de uma legislação trabalhista flexível, como também de trabalhadores “pacíficos”. A Mundialização do Capital, que trouxe as novas formas de organização da produção e novas relações de trabalho - como a terceirização - também chegou à universidade.
O modelo de Reforma Universitária, baseado em “sugestões” de relatórios do Banco Mundial, e a nova lei de inovação tecnológica têm como intenção a transformação das universidades em empresas de prestação de serviços tecnológicos. Isso não é um dado isolado. A disputa do comércio internacional pelas grandes multinacionais, como NESTLE, KRAFT, NIKE, ADIDAS, FIAT, GM e COCA-COLA tem dois lados: a busca por mão de obra cada vez mais barata e a necessidade cada vez maior de investimento em tecnologia para desenvolvimento de novos produtos (Chesnais, 2001).
A Universidade Pública tem cumprido esses dois modelos, formando mão de obra qualificada para lecionar nas escolas e ocupar cargos nas empresas e estabelecendo parcerias com empresas no desenvolvimento de pesquisa. A UFF tem vários exemplos de parcerias firmadas com multinacionais como a PETROBRAS, que recentemente fechou com a universidade um acordo para construção de um prédio onde se desenvolverá pesquisa na área de inteligência artificial. A PETROBRAS tem vários acordos com outras multinacionais como a italiana Pirelli, que desenvolve aparelhos técnicos e eletrônicos para perfuração de poços em alto mar.As multinacionais procuram as Universidades e Centros de Pesquisa Públicos justamente para baratear os custos de pesquisas, encontrando em professores e alunos uma reserva de mão de obra qualificada e barata.
O processo de privatização e disseminação da proposta político-ideológica liberal já vem ocorrendo dentro das universidades há algum tempo. Basta lembrar o caso das Fundações como a Euclides da Cunha, na UFF, que capta recursos privados (como o acordo que foi fechado com a PETROBRAS) e possibilita cursos pagos de pós-graduação, coisa que a universidade, como instituição pública, não poderia fazer por conta própria.
O esquema das Fundações, que se espalham pelo país, é engenhoso. Ele promove uma espécie de lavagem de dinheiro, pois as fundações tornam possível o recebimento de capital privado oriundo dos MBA’s e cursos Latu Sensu pagos, como o da História, repassando algo em torno de 5% para universidade sob forma de doação, enquanto o restante enche o bolso de professores e alunos que preferem fazer dinheiro utilizando a estrutura pública mantida pelo povo trabalhador em vez de lutar pela melhoria e construção da Universidade Popular.
Existe ainda o acordo da Guarda Municipal e da Policia Militar com o Núcleo Fluminense de Pesquisas (NUFEP), coordenado pelo Professor de Antropologia Roberto Kant de Lima. O treinamento das forças de repressão de Niterói e do Estado do Rio é feito, em parte, dentro da universidade. E Parece que está dando certo. Essa mesma guarda municipal que aprimora seus métodos na universidade espanca camelôs e rouba os produtos apreendidos. A policia militar, por sua vez, mata crianças no Morro do Estado, espanca trabalhadores em São Gonçalo e estudantes em greve na UFF, assassina em Queimados e seqüestra crianças em Vigário Geral. A universidade seria mais útil instrumentalizando as vítimas de todas essas formas de opressão do que camuflando a repressão policial com o discurso da capacitação.
As universidades públicas, construídas com trabalho usurpado do povo pelo Estado e pelas empresas, são direcionadas para a exploração dos trabalhadores. Pesquisas encomendadas por empresas têm o único interesse de maximizar lucros. A prática conservadora e reacionária de professores que se aceitam tais encomendas vem promovendo a formação de trabalhadores subservientes à exploração, pois formam estudantes que já saem de seus cursos moldados para o mercado, adaptando-se a ele sem capacidade de crítica. Isso nada mais é do que a ideologia liberal enfeitada com a máscara do pós-modernismo.
A necessidade de profissionais cada vez mais adaptados às relações de exploração é uma condição fundamental para o funcionamento do novo modo de acumulação do Capital. As universidades, através de seus dirigentes e parte dos professores, fazem isso muito bem; incentivam a formação de Empresas Juniores, como a Analítica, de Ciências Sociais, e a Meta Consultoria, da Engenharia, a mais famosa das empresas juniores da UFF. Sua ideologia é vendida como modelo de aplicação da Ciência aprendida em sala de aula.
Pela lógica empresarial, todo conhecimento produzido na Universidade tem como objetivo maximizar os lucros das empresas. Isso é feito através de acordos com multinacionais, cuja prática aumenta opressão sobre o povo. Todo esse processo, que transforma a universidade numa empresa prestadora de serviços ao capital e formadora de mão de obra qualificada (no caso, barata e subserviente), é a cartilha para educação do Banco Mundial e do “mercado” (bancos, multinacionais, fundos de pensão, empresas de consultoria etc.).
Esse tipo de trabalho, ideologicamente afinado com a mundialização
[1] do capital, é necessário para o Governo e para os acionistas das grandes multinacionais. O índice de desemprego crescente e a competição do Brasil com pólos periféricos regionais, como o Leste Europeu, mostra a necessidade imediata de uma geração de trabalhadores dóceis ao sistema. Assim, fica mais fácil aumentar a produtividade e retirar os direitos trabalhistas conquistados depois de muita luta.
Infelizmente, os estudantes das universidades públicas brasileiras têm a doce ilusão de que seu futuro no mercado de trabalho está garantido. A ilusão de que todos serão grandes pesquisadores das universidades brasileiras ou altos executivos é apenas a propagação ideológica dos setores conservadores da universidade, que insistem em afirmar a neutralidade científica, elitizando cada vez mais os espaços universitários.
A ilusão vendida, que é muito antiga e ganha força hoje, é a de que através de uma boa qualificação, o que significa investir em mestrados e doutorados (em muitos casos pagos), torna-se possível alcançar o “estrelato”. A verdade é que apenas uma minoria ascende. A maioria dos estudantes será mão-de-obra qualificada e barata nas empresas públicas e privadas, escolas e universidades. E ainda aceitarão sua condição de explorados com naturalidade, afinal a própria universidade incentiva a lógica empresarial, adaptando currículos às necessidades dos agentes do mercado.
Na medicina, por exemplo, ideal de sucesso social, a maioria dos estudantes, oriunda da classe média e da burguesia, pouco se importa para situação dos Hospitais Públicos, ou para o desenvolvimento de uma Medicina Social Preventiva no Interior e nas periferias e favelas do país, preferindo abandonar a profissão a suprir a falta de médicos nesses locais. Na economia, vemos a eterna reprodução das teorias ortodoxas liberais. Nos cursos de História e Ciências Sociais, ignoram-se autores como Proudhon, Lênin, Bakunin e, até mesmo, Florestan Fernandes, conhecido apenas como nome de auditório, e quase nunca trabalhado em sala de aula.
O quadro real da relação formação-trabalho é bem claro e tem apenas duas preocupações: 1) a formação de profissionais tecnicamente qualificados e 2) a formação política dos novos trabalhadores dentro dos moldes do pensamento liberal. Esse quadro propaga como vertente principal a ineficácia da ação coletiva, deslegitimando os Sindicatos e as demais organizações dos trabalhadores. Ao aceitar tal ideologia, o estudante torna-se um trabalhador passivo e subserviente.
Como contraposição a essa lógica mercadológica, existem projetos concretos em construção na UFF. A Oficina de Ciências Sociais é um desses projetos. Nela a ciência é um instrumento para a libertação do povo e não para o fortalecimento de seus grilhões.
Nesse contexto, o movimento estudantil revolucionário e popular tem o dever de formar, nas ações diretas, o trabalhador de amanhã. Só através da ação direta, que quer dizer ação coletiva organizada não necessariamente vinculada a partidos, por exemplo, piquetes, paralisações, greves gerais, barricadas, fechamentos de rodovias entre outros, pode-se desmistificar a falácia de que as soluções para os problemas sociais estão na conquista de um bom emprego ou em qualquer outro caminho individualista. Até mesmo porque, conquistas individuais, como a aprovação no vestibular e a conclusão de um curso, não significam garantias de melhoria de vida, principalmente em um contexto de desemprego estrutural, que sempre acompanha os “avanços” neo-liberais.
A Ação Direta Estudantil tem como objetivo principal organizar estudantes secundaristas e universitários numa forte corrente de solidariedade e luta pela conquista de uma educação que seja popular , democrática e de libertação , e pela Universidade Popular: aberta ao povo, a serviço do povo. Além disto, busca contribuir com a organização e luta popular mais ampla rumo à construção do Poder Popular, ou seja, uma sociedade justa, solidária e livre, assim é necessária a construção de um Movimento pela Universidade Popular para que possam unir os estudantes na luta contra a destruição das universidades públicas e na luta por uma universidade do povo.

Fora Cursos Pagos!
Por uma Escola popular e de libertação!
Pela Universidade Popular!
[1] Mundialização do Capital. Liberalização do Comércio, de investimento e deslocalização da produção promovida pelas Multinacionais (complexos organizados em rede com um centro financeiro) que procura mdo barata e incentivos governamentais. Conceito definido no livro “A Mundialização do Capital”, de François Chesnais.

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